Em uma madrugada insône, encontrei no facebook, esses versos do cantor, compositor, poeta e escritor brasileiro, que vive em Lisboa, Pierre Aderne, que são fragmentos do seu primeiro livro, Tempescendo, sempre em versos cruzados e emparelhados, na mesma estrutura dos Lusíadas.
Eles, os versos, que considero geniais, me calaram fundo na alma confusa daquela madrugada fria e louca, e que a "substância" publica agora.
peito cheio de choro que não goza
que pára na escotilha da garganta
preso ainda na última prosa
tentando esquecer o que não adianta
só o último perfume da ultima rosa
pra fazer andar quem ja não levanta
no campo de batalha eu deitei no meio
pra morrer com balas do seu recreio
apenas o corpo e a culpa carrego
condenados a infinitas noites em claro
crucificado sem sangue e sem prego
num luto branco de um tinto raro
mãos a frente de alma me entrego
aos pés do abismo que eu já não paro
sopro baixinho no ouvido de deus
pro vento levar o diabo que atormenta os meus
quinta-feira dura que nunca acaba
escravo acuado na própria senzala
chibatadas no lombo o corpo desaba
e os ossos pesados não cabem na mala
curumim sem oca sem taba
sem olhos sem canto sem fala
a vida termina antes do fim
sem caixão que caiba em mim
(Pierre Aderne)