Eu poderia resumir o dia do aniversário do pai da bossa nova, com um eloquente e frio parabéns, muito obrigado, eteceteras, mas ninguém faz oitenta anos a toa, muito menos João Gilberto, em plena forma, atuando e encantando o mundo inteiro com o seu toque único.
Eu tinha mais ou menos 14 anos, quando fui apresentado a João, através do LP de capa branca, que eu até hoje chamo de o "disco branco", porque iluminou a minha vida, e que se chama simplesmente, "João Gilberto".
No principio eu não entendi muito, mas compreendi tudo imediatamente, quando escutei, Izaura, com a participação exaustiva da Miúcha, cantando com ele, repetidas vezes a mesma canção. Só que a cada entrada do João, ele dava uma nova versão de Izaura. Lindo de doer. No mesmo disco tem a fantástica "É preciso perdoar" e "Falsa baiana", que o meu irmão Lula Duarte Ribeiro, me ensinou a harmonia e me apresentou ali os acordes dissonantes. Ali, com os acordes dissonantes, eu decidi o que eu queria fazer na vida, música para relaxar o mundo.
Depois, muito mais tarde, morando no Rio e tentando começar (ainda estou tentando até hoje) veio o "Amoroso", com Wonderful, Estate, Caminhos cruzados, Besame mucho, Tim tim por tim tim.
Devoção absoluta.
E depois vieram outros e mais outros e a cada outro, ainda que para muitos parecesse repetição, para mim e para muitos outros havia sempre um detalhe.
João Gilberto é o detalhe e ponto.
Ah João! Obrigado por tudo mestre, pela lei do silencio, quase nunca respeitada.
Obrigado por me ensinar a escutar, a rezar, a ouvir o meu coração.
Quanta poesia tem o silencio da tua música que eu tento seguir em vão e agradecido ao mesmo tempo.
Salve João Gilberto e a sua batida inconfundívelmente dissonante e perfeita.
Salve para sempre, por muitos oitenta anos vida a fora.
Futuro onipresente.
Salve João Gilberto para sempre, salve!