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domingo, 6 de outubro de 2013

SONETO DE UM DOMINGO


Em casa há muita paz por um domingo assim.
A mulher dorme, os filhos brincam, a chuva cai…
Esqueço de quem sou para sentir-me pai
E ouço na sala, num silêncio ermo e sem fim,

Um relógio bater, e outro dentro de mim...
Olho o jardim úmido e agreste: isso distrai
Vê-lo, feroz, florir mesmo onde o sol não vai
A despeito do vento e da terra que é ruim.

Na verdade é o infinito essa casa pequena
Que me amortalha o sonho e abriga a desventura
E a mão de uma mulher fez simples, pura e amena.

Deus que és pai como eu e a estimas, porventura:
Quando for a minha vez, dá-me que eu vá sem pena
Levando apenas esse pouco que não dura.
(Vinícius de Moraes)

sábado, 5 de outubro de 2013

SONETO DO AMOR TOTAL


Amo-te tanto, meu amor ... não cante
O humano coração com mais verdade ...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade.

Amo-te afim, de um calmo amor prestante
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim, muito e amiúde
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.
(Vinícius de Moraes)

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

CERTA VEZ EM COIMBRA...

Contam que certa vez em Coimbra, Vinícius recitou este soneto para os estudantes da Universidade de Coimbra, que extasiados, ao final da récita, estenderam no chão as suas capas pretas, para que o poeta pudesse passar. Na terra de Camões e Fernando Pessoa, não é qualquer um que recebe tal reverência.

 POÉTICA

DE MANHÃ ESCUREÇO
DE DIA TARDO
DE TARDE ANOITEÇO
DE NOITE ARDO.

A OESTE A MORTE
CONTRA QUEM VIVO
DO SUL CATIVO
O ESTE É MEU NORTE

OUTROS QUE CONTEM
PASSO A PASSO:
EU MORRO ONTEM

NASÇO AMANHÃ
AONDE HÁ ESPAÇO:
- MEU TEMPO É QUANDO.
(Vinícius de Moraes)

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

SONETO DO AMIGO



Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...
(Vinícius de Moraes)

domingo, 4 de agosto de 2013

SONETO DA INVEJA



TENHO INVEJA DOS QUE MORREM
DOS QUE NÃO VEEM A LUZ DO DIA
DE TODO AQUELE QUE NÃO SOFRE
DOS QUE SÓ CHORAM DE ALEGRIA

TENHO INVEJA DOS QUE DORMEM 
DOS QUE NÃO ACORDAM PRA VIDA
DOS QUE NO SONO ESCOLHEM
SONHAR EM PAGAR A DÍVIDA

TENHO COMIGO A INVEJA
DE NÃO SONHAR ACORDADO
E NÃO DIZER NÃO A QUEM ME NEGA

TENHO COMIGO A INVEJA
ESSE SENTIMENTO ALEIJADO
COMUM A QUEM NÃO SE ENTREGA
                                                                                                            

sexta-feira, 26 de julho de 2013

SONETO DA CORAGEM



CIENTE DE QUE NUNCA SE SABE
O TEMPO QUE DURA A VIAGEM
NAS VOLTAS QUE O MUNDO DÁ
SÓ ME RESTA TER CORAGEM

CORAGEM PARA ACORDAR
E ABRIR TODAS AS JANELAS
PARA QUE O SOL POSSA ENTRAR
E ME MOSTRAR QUE A VIDA É BELA

BELA PARA VIVER
VELA  PARA REZAR
OLHOS PARA VIGIAR

VIGIAR PARA VENCER
VENTO PARA SOPRAR
CORAGEM PARA ENFRENTAR
                                                            


quarta-feira, 24 de julho de 2013

SONETO DO MEDO


Quando estou com medo
ligo para minha mãe 
ou para meu melhor amigo
que é quase a mesma coisa

Quando estou com medo
viro menino de novo
grito choro desatino
temendo não ter escolha

Ter medo é tatear no escuro
sem forças para pular o muro
ou abrir a porta pra vida

É não vislumbrar o futuro
e navegar no mar turvo
dentro de um barco a deriva
                                                  RD